Novo parasita encontrado em bobo-grande alerta para disseminação de novos patógenos em aves marinhas
Pesquisadora do Projeto Albatroz participou do estudo que identificou as bactérias, comum entre mamíferos, em ave encontrada morta no RJ
Para além das mudanças climáticas, da ingestão de lixo plástico e da interação negativa com a pesca, há outras ameaças no horizonte das aves oceânicas. Pesquisadores brasileiros identificaram, pela primeira vez, dois tipos de bactérias do gênero Bartonella spp. em piolhos que parasitam uma ave marinha migratória do grupo dos albatrozes e petréis, o bobo-grande (Calonectris borealis). O achado amplia a lista de espécies infectadas por essa bactéria, até então encontrada comumente em mamíferos e em seus ectoparasitas, e acende um alerta sobre o impacto nas aves marinhas e seu potencial para amplificar a circulação global de patógenos.
A equipe analisou 38 piolhos retirados de um único exemplar de bobo-grande, encontrado morto na costa do Rio de Janeiro e necropsiado por técnicos do Projeto de Monitoramento de Praias (PMP-BS), e identificou duas espécies de piolho mastigador: Halipeurus abnormis e Austromenopon echinatum, ambas já conhecidas em aves do grupo das pardelas, bobos e cagarras. Em 15 desses piolhos, os cientistas detectaram DNA de Bartonella spp. por meio de testes moleculares, com alta taxa de positividade para A. echinatum.
Os pesquisadores identificaram dois genótipos distintos de Bartonella, um associado a cada espécie de piolho. O genótipo encontrado em H. abnormis mostrou grande semelhança genética com Bartonella vinsonii berkhoffii, bactéria relacionada a casos de endocardite em cães, enquanto o genótipo de A. echinatum se aproximou de uma Bartonella previamente encontrada em morcegos neotropicais.
Tradicionalmente, a Bartonella é estudada em mamíferos e em alguns vetores como pulgas e carrapatos, mas já havia sido detectada em aves (incluindo as marinhas) e répteis. Porém, o estudo foi o primeiro a associar a bactéria a tipos de piolhos específicos de aves marinhas, sugerindo que esses ectoparasitas podem participar da manutenção ou transmissão da bactéria em ambientes oceânicos.
“Esse é o primeiro caso de co-infestação de duas espécies de ectoparasitas carregando duas espécies diferentes de bactérias transmissoras de doenças que podem colocar não só as aves, mas outras espécies marinhas ameaçadas de extinção em perigo", explica Alice Pereira, pesquisadora do Projeto Albatroz, patrocinado pela Petrobras, e responsável técnica do Banco de Amostras de Albatrozes e Petréis (BAAP).
Ela explica que, como os bobos, pardelas e albatrozes realizam longas migrações oceânicas entre continentes, e podem contribuir para levar carrapatos, piolhos e outros microrganismos por grandes distâncias, conectando ecossistemas distantes. “A presença de dois genótipos de Bartonella em piolhos de uma mesma ave reforça a ideia de que a diversidade de vetores dessa bactéria é muito maior do que conhecemos", conclui.
Pesquisa e conservação
O estudo aponta caminhos para novas pesquisas que ajudem a aprofundar o assunto, incluindo análises de outras espécies de aves marinhas e seus piolhos, além de pesquisas experimentais que avaliem se esses ectoparasitas são apenas portadores ou vetores competentes da bactéria.
É consenso entre os autores do estudo que entender o papel de aves marinhas migratórias e seus parasitas na ecologia de patógenos é essencial para prever riscos de novas zoonoses em um planeta cada vez mais conectado. A disseminação recente do vírus da influenza aviária H5N2 entre aves migratórias e marinhas é um exemplo disso, ressalta Alice Pereira.
A pesquisa foi publicada como “First molecular detection of Bartonella spp. in two chewing louse species (Amblycera: Menoponidae and Ischnocera: Philopteridae) parasitizing Calonectris borealis”, por pesquisadores do Instituto Butantã, do Departamento de Patologia, Reprodução e Saúde Única da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da UNESP, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva e Saúde Animal da USP, do Departamento de Biologia Animal da UNICAMP e do Projeto Albatroz. A íntegra do estudo está disponível na revista Veterinary Parasitology: Regional Studies and Reports e pode ser acessada neste link.
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Imagem: Leo Merçon